Desde a sua fundação, o ITV DS investe em estudos e pesquisas que buscam promover a conservação da biodiversidade e seus consequentes usos para a sociedade. Isso é feito de forma associada ao conceito de sociobioeconomia, já que a Vale – empresa mantenedora do Instituto – está instalada dentro da Floresta Nacional de Carajás, ainda praticamente conservada, de onde extrai minério. Logo, pensar em soluções baseadas na natureza faz parte do negócio da empresa que mantém no ITV DS um curso de Mestrado Profissional em Uso Sustentável dos Recursos Naturais em Regiões Tropicais, desde 2013, formando recursos humanos para a Amazônia e para o Brasil.
“Acredito que, somente na Floresta Nacional de Carajás, há material biológico suficiente para movimentar vários ramos da indústria, desde os fármacos, alimentos, cosméticos, bem-estar…logo ao fazer investigações sobre o tema o ITV DS contribui para o avanço da ciência e para o desenvolvimento tecnológico. Assim, o mestrado do ITV DS atua em duas linhas de pesquisas, sendo uma delas Uso Sustentável dos Recursos Biológicos. Além disso, a Diretoria de NBS da Vale atua na área de bioeconomia tanto no formato acadêmico e científico, através do ITV DS e da RNV, como no apoio a negócios em bioeconomia, através do Fundo Vale. O Brasil possui legislação específica sobre acesso a Patrimônio Genético e Conhecimento Tradicional associado à biodiversidade e é signatário da Convenção da Diversidade Biológica e o ITV DS/Vale atua de acordo com as exigências do Marco Legal.” É o que afirma Maria das Graças Ferraz Bezerra, professora de filosofia, especialista em Política Internacional de Ciência e Tecnologia, Mestre em Ciência Política e doutora em Ciências Sociais, com área de concentração em antropologia.
A trajetória profissional de Graça Ferraz iniciou-se no Museu Paraense Emílio Goeldi. Lá, ela acumulou experiência na área de planejamento e gestão em Ciência e Tecnologia ao mesmo tempo em que estudou e avançou na carreira acadêmica. Graça também foi coordenadora da Estação Científica Ferreira Penna, do Museu Goeldi, um sítio de pesquisas situado no município de Melgaço (PA), no coração da Amazônia, que recebe investigadores de todo o mundo.
Foi na Flona Caxiuanã, que Graça começou a experiência em trabalhar com populações tradicionais, especialmente ribeirinhos, extrativistas e pescadores/as artesanais. Foi nesse período, também, que a pesquisadora percebeu um problema estrutural na ciência: a omissão da importância dos conhecimentos de povos tradicionais para o desenvolvimento de pesquisas científicas.
“Comecei a trabalhar com populações tradicionais na Floresta Nacional de Caxiuanã. Lá, a gente recebia pesquisadores do mundo inteiro. Vinham cientistas do Reino Unido, da Índia, Japão, Argentina, dentre outros países, além de vários cientistas brasileiros, de outros estados. Por se tratar de uma unidade de conservação situada no meio da Floresta, os pesquisadores saíam em grupo para o campo. A Estação Científica contratava moradores locais para acompanhar as equipes de pesquisa, devido ao seu conhecimento local. Então, era o morador da floresta que nos auxiliava durante as pesquisas. Por exemplo: eles ajudavam desde a instalação de equipamentos e até à coleta de espécimes da flora e da fauna.Percebi que, enquanto estávamos em campo, dependendo dos moradores que atuavam como “guias de campo” estes eram considerados imprescindíveis para a pesquisa. Por esta razão, durante a pesquisa de doutorado, investigando como se dava a produção do conhecimento, especialmente a relação do conhecimento científico com o conhecimento local, fiz a seguinte pergunta a vários pesquisadores de nacionalidades diferentes: “Você compartilharia a autoria do seu paper ou sua tese com o guia de campo que te auxiliou desde o início da estadia na floresta?” E 99% das respostas foi não. Quase todos consideraram que o conhecimento acadêmico é superior ao conhecimento tradicional. Foi por esse motivo que decidi enveredar pela questão da propriedade intelectual, aprofundando os estudos sobre os conhecimentos de populações tradicionais.”
Respeito, diálogo e colaboração
Segundo Graça Ferraz, o conhecimento tradicional, associado à biodiversidade, é a informação ou prática realizada por populações tradicionais, sejam indígenas, quilombolas, agricultores tradicionais, quebradeiras de coco, pescadores artesanais e outros, relativos a propriedades e/ou usos diretos ou indiretos associados ao patrimônio genético. O acesso a esses saberes é regulado pela lei.
“Entendo que o respeito é a base de qualquer diálogo entre o conhecimento científico e o conhecimento tradicional, que, a meu ver, são conhecimentos complementares. Em nenhuma situação o valor de um conhecimento se sobrepõe ao outro. No ITV, durante a realização da pesquisa, os pesquisadores seguem rigorosamente a Legislação relativa à biodiversidade e ao conhecimento tradicional a ela associado.”, comenta a pesquisadora.
Graça defende também que “partindo do diálogo respeitoso, a participação de povos tradicionais em pesquisas científicas deve ser pautada pela ética”. Segundo a pesquisadora, o conhecimento tradicional possui o mesmo valor do conhecimento científico e vem sendo aplicado de forma eficaz. “A prova disso é a sobrevivência harmônica dos povos originários com a natureza, o que os transformou em verdadeiros guardiães da floresta viva. Logo, o que deve haver é uma troca de saberes onde todos se beneficiam”, finaliza.