“A ciência tem que ser analisada com critérios. Às vezes ela vai te dar respostas que surpreendem, principalmente quando há verdades absolutas”, é assim que Paulo Pontes explica a importância de seus estudos. Paulo é engenheiro civil de formação, mas foi na área de hidrologia que ele desenvolveu suas principais pesquisas. Atualmente, Paulo integra o grupo de Geologia e Recursos Hídricos, do ITV. 

Um dos trabalhos realizados por Paulo e co-autores do ITV utilizou técnicas de modelagem matemática, sensoriamento remoto e monitoramento na bacia do Rio Itacaiúnas, onde estão as áreas de mineração no Norte do Brasil. O estudo buscou entender os processos hidrológicos da região e a relação dos recursos hídricos com diversas paisagens, como a floresta e as áreas desmatadas. Devido a extensão da bacia, não era possível compreender todo o processo apenas com os dados fornecidos pelas estações meteorológicas do ITV. Assim, a equipe começou a trabalhar, então, com modelos matemáticos. 

“Implementamos o modelo hidrológico na bacia do rio Itacaiúnas. Em seguida calibramos esse modelo ajustando os parâmetros à realidade e verificando se os conjuntos de equações estão representando de forma satisfatória o sistema real. Com isso, conseguimos entender  qual o papel da floresta e do desmatamento nos processos hidrológicos da região”, explica o pesquisador. 

Em linhas gerais, o modelo implementado mostrou que na floresta há uma transferência de água muito maior que nas áreas de pastagem. Ou seja, a evapotranspiração na bacia é alta graças à área de floresta. Segundo Paulo, isso é importante em termos de regulação climática, pois esse processo favorece um clima mais agradável em uma região de floresta em relação a uma região desmatada.

Outra pesquisa que contou com a participação de Paulo foi o mapeamento das áreas de inundação na bacia do rio Itacaíunas. Com base na modelagem, os pesquisadores buscaram entender qual é a relação entre nível do rio e área urbana inundada. “A gente fez um trabalho de modelagem para verificar essas áreas de inundação. Buscamos compreender como a área de inundação pode variar com o aumento da vazão dos rios e, consequentemente, qual seria o risco para as populações ribeirinhas”, comentou. 

Vazão dos rios e desmatamento 


Ainda na busca de compreender os processos hidrológicos da região, a equipe analisou o processo de desmatamento que aconteceu na bacia desde os anos 70 até os períodos atuais. Paulo explica que, desde esse período, a bacia perdeu cerca de 50% da sua vegetação nativa, o que, junto da variabilidade climática, gera impactos no ciclo hidrológico. 

O resultado é esperado por pesquisadores da área de hidrologia, mas pode não ser tão evidente em outras áreas: foi verificado que o desmatamento aumentou as vazões máximas, médias e mínimas na bacia. O pesquisador explica que isso acontece porque, apesar da chuva não ter variado significativamente nos últimos anos, a evapotranspiração nas áreas desmatadas é menor que na floresta. Com isso, a vazão dos rios aumenta.”

“Esse resultado contradiz alguns mitos que dizem que a floresta gera água. Mas, na verdade, essa relação não é inteiramente verdadeira e depende de outros fatores. Então, nesse caso, ocorreu um aumento de vazões, que pode gerar inundações, o que é um problema para a população, por exemplo. Outros problemas podem ter relação direta com o aumento da vazão e do desmatamento, como o aumento da erosão nos rios”. 

Após a compreensão do processo histórico hidrológico, o grupo também investigou o impacto das mudanças climáticas na hidrologia. De forma geral, os modelos climáticos convergem indicando que pode haver uma redução de precipitação e aumento de temperatura nessa região do sudeste do Pará. Os resultados mostraram que, com as mudanças climáticas,  as vazões mínimas dos rios tendem a reduzir consideravelmente, impactando a disponibilidade hídrica para usuários de água na bacia. Já as vazões máximas podem aumentar, gerando mais inundações na região. Os pesquisadores também perceberam que o período seco ficará mais extenso e mais intenso.

O grupo ainda tem outros estudos em desenvolvimento, sobretudo, de forma multidisciplinar, envolvendo diferentes grupos do Instituto e ampliando a área de estudo para outras regiões da Amazônia. A ideia dos pesquisadores é compreender todo o ciclo hidrológico da região sob diferentes aspectos, considerando não só a vazão e o escoamento, mas a precipitação, evapotranspiração, temperaturas e biodiversidade.