De forma interdisciplinar, pesquisadores do ITV realizam estudo sobre a cacauicultura em Medicilândia no Pará
Enquanto a árvore da qual se origina é chamada de “árvore da vida”, o cacau também tem um apelido poderoso: “fruto de ouro”. Isso porque além da árvore se manter frutífera por longos períodos, é possível aproveitar tudo da árvore, tendo a amêndoa o maior valor agregado. Foram essas características que fizeram com que o Fundo Vale enxergasse a espécie como estratégica para a meta de reflorestamento.
A consequência desse interesse resultou no projeto “Cacau: polinização, fermentação e bioeconomia”. Segundo a DSc.Rosa Paes, este projeto, se divide em três eixos: “polinização” com o grupo de biodiversidade, coordenado pela DSc.Tereza Cristina; a “fermentação” é liderada pelo DSc.Rafael Valadares, do grupo de genômica; e a bioeconomia fica sob minha coordenação”, detalha a pesquisadora.
Conforme Rosa Paes, “o cacau tem várias características muito peculiares, entre elas o fato de poder ser manejado em consórcio com outras espécies. Isso auxilia tanto na recuperação de áreas desmatadas, quanto na recomposição florestal”.
Bioeconomia do cacau
A bioeconomia tem sido um elemento importante nas diretrizes da Vale e por consequência do ITV. Rosa explica que, apesar de ser um termo recente, o conceito de bioeconomia já existe há tempos. “Isso porque ele conversa muito com as economias originárias, dos princípios de se produzir sem desmatar, de buscar na natureza respostas e alimentos para garantir a segurança alimentar”, diz.
O projeto então tem se debruçado, primeiramente, em conhecer quem é o agricultor ou a agricultora que trabalha na lavoura do cacau. Rosa explica que um dos primeiros passos da pesquisa foi a realização de um perfil socioeconômico dos agricultores, para que fosse possível traçar soluções para a indicação de melhoria na qualidade de vida dos cacauicultores.
A pesquisadora esclarece que a segunda fatia da pesquisa refere-se à caracterização da lavoura. “Pesquisamos sobre a quantidade de lavouras dentro do imóvel rural, sobre quais as cultivares e como é feito o manejo do solo”. No terceiro recorte do projeto, os pesquisadores buscam entender sobre a condição fundiária, a qual está atrelada à investigação sobre a segurança jurídica desses imóveis rurais.
“Essas três vertentes do projeto não se sobrepõem, e sim, se complementam. Então, em linhas gerais, a socioeconomia com vistas à bioeconomia tem esses três elos de sustentação. Ao nos debruçarmos sobre essas informações, acredito que conseguiremos fazer uma política da bioeconomia, no mínimo, razoável”, comenta.
Levantamento socioeconômico e resultados da pesquisa
O município de Medicilândia, no Pará, foi o escolhido como o local de realização da pesquisa. A cidade está localizada no território da Transamazônica e é a maior produtora de cacau do Estado e uma das maiores do Brasil. A pesquisadora explica que a cidade se consolidou como pólo cacaueiro devido às características do clima e do solo da região – que são propícias para o cultivo do fruto – e à explosão da ocupação da Amazônia na década de 1970.
“Diante desses fatores, começamos a ter Medicilândia como referência em produção cacaueira. Na linguagem da agronomia, toda pesquisa precisa de ter uma ‘testemunha’, e Medicilândia se tornou a nossa para as pesquisas socioeconômicas, produtivas e fundiarias”, explica Rosa.
Durante o levantamento socioeconômico, os pesquisadores visitaram 360 imóveis na região. Os dados apontaram que mais de 60% dos entrevistados são casados e, segundo a pesquisadora, isso significa que a responsabilidade pelo imóvel rural é compartilhada. Os resultados também apontaram para um envelhecimento da população produtora, que é composta prioritariamente por adultos idosos.
“O primeiro ponto positivo denota a longevidade. Entretanto, a falta de sucessores na lavoura cacaueira revela um crescimento da categoria chamada de meeiro como principal mão de obra disponível para o labor nas lavouras. Quando falta mão de obra familiar, cria-se essa categoria de pessoas que assumem a lavoura, e há um reparte de toda a produção”, diz a pesquisadora.
Em resumo, além desses desdobramentos, a pesquisa também mostrou que há uma necessidade gritante de haver melhoramento genético na lavoura de cacau, além de assistência técnica rural qualificada e o refino na regularização fundiária e ambiental das áreas produtivas da região. Outro resultado do projeto foi a cartilha “O negócio da cacauicultura: guia para o produtor rural”, lançada na Casa da Cultura de Canaã dos Carajás em agosto de 2023. O material é destinado para os agricultores e apresenta ferramentas importantes para transformar o cultivo em algo rentável para as famílias produtoras.